Eu bem queria avançar, mas não me deixam. Seguem-se algumas notas acerca da opinião de Raquel Varela e Daniel Oliveira sobre a iniciativa organizada pela CGTP-IN no Dia do Trabalhador na Alameda, em Lisboa.
Varela argumenta que foram escolhidos (não diz como) dirigentes e activistas para participarem e que isso não corresponde ao espírito do 1.º de Maio. Ninguém sabe isso melhor do que a CGTP-IN, como se poderá ler nos seus comunicados e nas peças jornalísticas que lhes deram eco. A Intersindical organizou a iniciativa tendo em conta as condicionantes existentes. Como os argumentos de Varela raramente têm conclusões, o que deduzo é que, segundo ela, para fazer assim mais valia não se ter feito. Ou seja: ou iam as massas de trabalhadores que costumam encher as ruas ou não ia ninguém. Há ausências que não são presenças. Ela chama-lhe celebração colectiva. Eu chamo-lhe iniciativa colectiva de luta. Outra conclusão mais geral que podemos retirar da sua argumentação é que os trabalhadores não devem eleger ou escolher colegas para funções dirigentes e de representação nas suas organizações de classe. Parece assim sugerir que essa eleição ou escolha os apaga, embora estejam a exercer direitos democráticos. Se esta ideia for para ser levada a sério, ela é contrária à própria noção de organização sindical. Fico-me por aqui.
Oliveira reconhece que se cumpriu a lei e os cuidados sanitários, mas teme, diz ele, que se tenham criado fracturas entre trabalhadores. Diz que a CGTP-IN não avaliou bem o sentimento que se instalou no país. Há um sentimento de medo confuso criado no espaço público, por fazedores de opinião e informação parcial ou enganosa, com o qual a Intersindical não compactua, porque distorce a realidade. A Central tem acompanhado todos os sectores de actividades e as gritantes dificuldades dos trabalhadores em cada um deles. É, precisamente, por conhecer o justo sentimento de indignação de quem perdeu o emprego ou parte da remuneração e viu os seus direitos serem desrespeitados, como se nada valesse, que considerou necessário marcar o 1.º de Maio como uma jornada de luta na rua. A representatividade da iniciativa em Lisboa e de outras acções em mais 23 localidades (não esquecer, cada uma com a sua escala adequada) permitiram dar voz a problemas e reinvindicações, de âmbito mais específico ou mais abrangente, com a solidariedade que deve unir todos os trabalhadores.
A espuma dos dias não é um diapasão para a história do movimento operário e sindical. A esse movimento exige-se que saiba estar à altura do momento histórico, com os instrumentos de que dispõe. Orgulho-me de que a CGTP-IN tenha sabido corresponder àquilo que a sua base reclamava e as reacções dos trabalhadores nesse dia e nos dias seguintes confirmam isso. Ontem houve um protesto no complexo industrial de Sines denunciando a distribuição de dividendo a accionistas, enquanto são impostos despedimentos a centenas de trabalhadores e cresce a calamidade social. É fácil perceber que esta acção, cumprindo rigorosamente as indicações das autoridades de saúde, é um resultado das iniciativas do Dia do Trabalhador. Mas isto não é mostrado nas notícias nem é objecto de debate.