Avivar a História

12.09.2019


48.

Estranho esta ideia de que quem está contra qualquer projecto museológico em torno do espólio de António de Oliveira Salazar, para a partir daí construir um discurso sobre o Estado Novo, quer apagar a história. Vivemos num país onde a defesa da memória histórica do que foi a repressão fascista e da luta pela liberdade contra a ditadura quase não ocupam o espaço público nem os contextos educativos. Basta espreitar os livros e currículos escolares. O desconhecimento do nosso passado recente é cultivado em muitas escolas. É isso que vale a pena mudar, não apenas por respeito pelo passado, mas em nome do futuro. Tenho a experiência de mostrar um filme como 48 (2009) da Susana de Sousa Dias na universidade e registar a surpresa da maioria dos estudantes sobre a brutal violência política da PIDE em Portugal. Adelino Silva, Álvaro Pato, Conceição Matos, Domingos Abrantes, Manuel Martins Pedro, Matias Mboa: nunca tinham ouvido falar daqueles nomes. O de Salazar vai sendo nomeado, muitas vezes de forma amena, benévola, tolerável, mas ainda sem espólio. Hoje, João Miguel Tavares escreve no Público que Salazar criou uma “ditadura de baixa intensidade” — um insulto vil para quem foi perseguido, encarcerado, torturado, e morto ao lutar pela democracia. Hoje, o PNR e José Pinto-Coelho clamam “honra a Salazar”. Hoje, há uma onda bem real de extrema-direita que cresce na Europa. É neste momento histórico que estamos. Saibam os democratas estar à altura do que lhes é exigido.