O meu episódio favorito sobre o PCP e a religião passou-se na recta final da implantação de uma Festa do Avante, no dia de abertura, e envolveu um camarada muçulmano. Entre o meio-dia e o pôr do sol, eu e a Filipa (que pode confirmar estes acontecimentos) fomos buscar o carro a um dos parques de estacionamento. Quando nos aproximámos da saída, reparámos que o camarada encarregado de abrir e fechar o portão estava a fazer a terceira oração do dia (“Alá-sari”). Esperámos. Quando terminou, veio ter connosco para agradecer a compreensão. “Ora essa”, dissemos nós. O que há de extraordinário neste episódio inesquecível? Não é apenas a constatação da diversidade que convive no interior do PCP, que se traduz numa variedade de contributos para um projecto comum. É o facto de este homem religioso, de uma religião minoritária em Portugal e no PCP, ter demonstrado que as suas convicções religiosas eram respeitadas ao ponto de se sentir confortável para fazer as suas orações diárias (“Salá”) no contexto de actividades partidárias. Continua a ser uma lição para mim que tenho o dever de partilhar. Desmente melhor do que qualquer conversa abstracta a ideia feita — isto é, a ideia falsa — segundo a qual não há lugar para pessoas convictamente religiosas no PCP.