A Prática como Critério da Verdade

29.04.2020

Novembro de 1975, Álvaro Cunhal, inesquecível: “O que eu teimo é em querer fazer uma revolução com revolucionários, em querer fazer democracia com democratas, em querer fazer socialismo com socialistas.” Ao que podíamos acrescentar: “Em querer fazer trabalho unitário com quem procura a unidade.” Não é fácil, porque há quem diga que é uma coisa e isso é desmentido pelas suas acções. Como é simples demonstrar que a prática é o critério da verdade.

Vontade de Caminhar

25.04.2020

Gostava muito de ter histórias espantosas para contar sobre as comemorações do 25 de Abril quando era criança e adolescente. Infelizmente, não tenho. É a vida. A família onde cresci dava valor a esta data à sua maneira, mas nunca me levou a comemorações de rua. Nunca senti que fosse algo realmente importante até chegar a Coimbra — tão tarde, mas ainda a tempo certamente. Estive envolvido durante vários anos nas Comemorações Populares do 25 de Abril em Coimbra a partir de 2014, contribuindo para reunir várias organizações e pessoas com e sem filiação partidária que partilham a consciência do movimento libertador e emancipatório que brotou deste dia. Foi aí que percebi finalmente que para nós, aqueles que nasceram depois de 1974 e que não viveram a Revolução dos Cravos, a comemoração do 25 de Abril não é apenas um dever de memória, mas uma exigência do presente. Como se, não tendo estado em 1974, tivéssemos a oportunidade de reviver este dia, isto é, de lhe dar vida para continuarmos a transformar a sociedade portuguesa com os valores de Abril, construindo um Portugal mais justo e solidário, mais democrático e desenvolvido. Desde essa altura que sinto esta responsabilidade: não recordamos, continuamos. Ao caminho aberto tem de corresponder a nossa vontade de caminhar.

Lutar! Defender a Saúde e os Direitos dos Trabalhadores

20.04.2020

A CGTP-IN já comemorava o 1.º de Maio antes do 25 de Abril de 1974. Imaginem a força necessária para conseguir fazer isso. Não é este surto pandémico que o vai impedir nem as manobras do populismo mais reaccionário. Não se trata de uma mera celebração. É um momento comemorativo de luta pelos direitos e de valorização dos trabalhadores. Temos o dever de cumprir o nosso papel de denúncia dos abusos laborais que se têm avolumado. Temos o dever de ver mais além, mais longe do que este momento preciso, sem baixar a guarda. Porque amanhã será necessário que, no meio da devastação, continuemos de pé a defender a dignidade de quem vive do seu trabalho contra os esmagadores interesses do capital. A CGTP-IN é também uma organização de grande responsabilidade social, de acordo com os seus princípios e objectivos. Nunca organizaria comemorações que não estivessem em linha com as orientações que salvaguardam a saúde pública. Esta posição é consistente com a defesa intransigente que a Central tem feito da garantia de protecção dos trabalhares e de quem contacta com eles. Como a Secretária-Geral disse ontem à Rádio Renascença: não vai haver desfiles nem manifestações. Mas a voz da CGTP-IN e da multidão de trabalhadores que representa vai-se fazer ouvir, utilizando os meios adequados a este período que vivemos.

Ler Antes de Assinar

20.04.2020

Eu sei que muitas vezes as pessoas assinam sem ler, tal como votam sem conhecer. Mas essa exigência corresponde ao mínimo de seriedade no debate político. As petições sobre as comemorações do 25 de Abril na Assembleia da República têm diferenças profundas. De um lado, há uma petição que sauda simplesmente a homenagem que o povo e o Parlamento prestam ao 25 de Abril, deixando em aberto como pode ser feita. Do outro lado, uma petição mentirosa, na veia do Chega!, que fala em “centenas de pessoas” no interior da Assembleia da República e que exige, pura e simplesmente, o cancelamento das comemorações no Parlamento, independentemente de como forem feitas. Quem assinou esta última petição e defende uma cerimónia ainda mais minimalista do que aquela que está planeada (com os 77 deputados que têm estado em funções no hemiciclo, mais, no máximo, 53 convidados noutro espaço), subscreveu um texto contraditório com a sua posição. E contribuiu para um ataque à celebração da data fundadora da democracia em Portugal e, sem dissimulação, à própria democracia que saiu de Abril e de Maio. Coisa pouca.

Entendamo-nos

19.04.2020

A ver se nos entendemos antes que o populismo nos dê a volta à cabeça. Respeitando as orientações da Direcção Geral de Saúde, as aglomerações de Páscoa não aconteceram, tal como a de 13 de Maio em Fátima não irá acontecer, tal como não haverá manifestações no 25 de Abril e no 1.º de Maio. A Páscoa não foi cancelada. O 13 de Maio não foi cancelado. O 25 de Abril não foi cancelado. O 1.º de Maio não foi cancelado. As pessoas têm encontrado as melhores formas de os celebrar nesta situação de pandemia. A Assembleia da República tem funcionamento com menos deputados, garantindo a discussão política e a deliberação legislativa. Não há nenhuma razão para que não celebre a data fundadora da democracia — para todos, para quem é católico e quem não é — com apenas 130 pessoas, quando a sala tem 920 lugares. Mesmo que alguns aderentes não se apercebam, este movimento contra a sessão solene comemorativa do 25 de Abril é profundamente anti-democrático.

A Disputa do Estado

10.04.2020

A conversa entre Ricardo Araújo Pereira e João Cotrim de Figueiredo da Iniciativa Liberal foi esclarecedora. Os liberais não são anarquistas. Não vale a pena confundir exercícios caricaturais com debate ideológico. Como é evidente, os liberais não têm como horizonte a destruição do Estado (como os anarquistas) ou o seu definhamento (como os comunistas). Querem perpetuá-lo, reduzindo-o ao essencial. E eis o essencial: numa sociedade dominada pelos grandes interesses capitalistas — como já diziam Marx, Engels, e Lénine —, o Estado é um produto do antagonismo inconciliável entre classes, um instrumento para conservar a divisão social, a exploração laboral, e a concentração da riqueza. O Estado é uma instituição recente na história da humanidade e não se situa acima da sociedade humana, de uma forma neutra, mas emergiu dela na modernidade. Por isso, expressa, promove, ou resolve as contradições sociais existentes.

Elogio ao Serviço Nacional de Saúde

06.04.2020

Neste tempo de pandemia, a saúde e a vida têm sido bem defendidas em Portugal pelo Serviço Nacional de Saúde. Debilitado por sucessivos governos, tem resistido com a força de quem por ele luta, profissionais e utentes em união. Houve quem fomentasse esse enfraquecimento com opções que abriram espaço para o negócio crescente dos grandes grupos privados do sector, como a José de Mello Saúde (rede CUF) e a Luz Saúde. Perante esta evidência, a hipocrisia de hoje da direita política tem que ser assinalada. A sua actuação nunca foi guiada pelo direito à saúde ou pelo dever da solidariedade. Houve também alguns avanços na anterior legislatura: redução do horário de trabalho para 35 horas; alargamento da contratação de médicos e enfermeiros; descongelamento de carreiras; mais utentes com médico de família; redução das taxas moderadoras (eliminação, nalguns casos); redução dos custos com medicamentos; exclusão da aplicação de cativações ao SICAD, ao INEM e à DGS; novas equipas de cuidados paliativos; inclusão de mais hospitais no plano de investimento público; aprovação de uma nova Lei de Bases da Saúde; entre outros. Mais do que nunca, é necessário defender e desenvolver um Serviço Nacional de Saúde generalizado, universal, gratuito, como foi justamente pensado e incluído na Constituição da República Portuguesa de 1976, fruto da Revolução de Abril de 1974. Defendê-lo e desenvolvê-lo é garantir a igualdade social que promove a liberdade individual.

O Vírus da Hostilidade

04.04.2020

A atitude anti-República Popular da China espalha-se e é tão irracional e tão perigosa como a anti-Estados Unidos da América. Confunde-se tudo: a conspiração com a explicação, a ignorância com o conhecimento, o pensamento crítico com o preconceito, a parte com o todo, as especulações com os factos. Sem dúvida, esta resposta tem a ver com uma certa impotência sentida perante as dificuldades da realidade que enfrentamos. Tal sentimento conduz à procura de um “bode expiatório”, concentrando violentamente nele a frustração e a ira. É um mecanismo antropológico conhecido, exposto e subvertido pela Paixão de Cristo, como explica René Girard. A humanidade tarda em aprender esta lição. Neste caso, tem também um fundo de desconfiança e temor, e um subtexto de superioridade, que é profundamente xenófobo. A designação do SARS-CoV-2 por algumas pessoas, incluindo algumas personalidades da televisão e figuras de estado, como o “vírus chinês” é uma instância do discurso agressivo que foi contribuindo para estado de coisas. A pertússis é um “doença bacteriana americana”? O zika é um “vírus brasileiro”? Estes agentes infecciosos não têm nacionalidade, ao contrário das pessoas. Saibamos nós rejeitar esta tentação, neste tempo que expõe as feridas abertas das desigualdades sociais, do desinvestimento nos serviços públicos, da desvalorização dos seus profissionais, e que nos exige uma política da solidariedade, da cooperação, da igualdade, na resposta à emergência gerada pela pandemia. Esta hostilidade que podemos rejeitar é um vírus com efeitos bem mais duradouros.

Cultura Abaixo do Limiar da Pobreza

03.04.2020

O Ministério da Cultura anunciou um milhão de euros para apoiar projectos... no fim de 2020. Apoiou um “marketplace” para que grandes empresas decidam se remuneram (ou não) artista e projetos artísticos. E aos trabalhadores do sector da cultura que não têm, hoje, como pagar despesas quotidianas, cujas actividades profissionais foram canceladas ou adiadas para sabe-se lá quando, o que oferece o Governo? Um rendimento mensal quase 200 euros abaixo do ordenado mínimo, um valor inferior ao limiar da pobreza: 438,81€. Detalhes sobre esta situação indigna aqui num comunicado do Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, do Audiovisual e dos Músicos – CENA-STE sobre uma reunião com a Ministra da Cultura.

Produzir para Libertar

03.04.2020

“Portugal terá de voltar a produzir o que se habituou a importar da China.” É espantoso. Basta passar tempo suficiente ou surgir uma crise severa. Tudo aquilo que o Partido Comunista Português não se cansou de dizer, muitas vezes quase isolado, só com os companheiros da Coligação Democrática Unitária (o Partido Ecologista “Os Verdes” e a Intervenção Democrática), tantas vezes ostracizado, tornou-se agora uma evidência. Um país que perde uma imensa parte da sua capacidade produtiva, endivida-se, abre mão da sua soberania popular, fica sujeito à dependência externa e à chantagem impositiva, abdica de ter verdadeiros instrumentos de desenvolvimento.

Apoiem o Comércio Local

02.04.2020

Para quem está em confinamento, a trabalhar de casa, e tem compras para fazer: apoiem o comércio local.

Lay-off

01.04.2020

O lay-off prejudica os trabalha­dores porque reduz a sua remuneração e lesa o sistema público de Segurança Social porque o descapitaliza. Este mecanismo está a ser usado em Portugal por multinacionais com lucros de milhões de euros, acumulados e aumentados ano após ano, como a PSA (Peugeot, Citroën, Opel) ou a FNAC. A perversidade desta solução salta à vista. A natureza predadora do capitalismo também.