Discursos Viscerais

22.07.2018

O comissário europeu Carlos Moedas (do PSD) diz que BE e PCP têm um “discurso visceral contra as empresas”. Acrescenta que é preciso “levantar a voz contra esse tipo de discurso”. Quase o ouvimos cantar: “De pé, ó vítimas da fartura! De pé, fartos da terra!” Moedas reproduz um discurso em que o preconceito é vestido de senso comum. Um discurso que esconde a realidade das posições e propostas políticas. Um discurso que promove a desinformação e a ausência de pensamento crítico.

A CDU tem disputado eleições com candidatas e candidatos, por vezes como cabeças de lista, que são empresárias e empresários. Algumas e alguns são militantes do PCP. Basta consultar as listas das últimas eleições autárquicas.

O PCP promove encontros regulares com micro, pequenos e médios empresários — o último foi há dois meses (intervenção de Jerónimo de Sousa). E em 2003 promoveu um encontro nacional sobre este sector (declaração final).

O PCP tem reunido regularmente com as organizações das micro, pequenos e médios empresas (MPME), nomeadamente com a CPPME – Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas (declaração da reunião em 2013 e registo da reunião em 2016).

O PCP tem apresentado Projectos de Resolução e de Lei e um conjuntos articulado de medidas legislativas na Assembleia da República (declaração em Janeiro de 2017) sobre as MPME, o emprego e o crescimento económico.

Ou seja, trata-se de uma linha de trabalho político fundamental para o PCP. O discurso do PCP não é contra as empresas: é contra os monopólios capitalistas e a exploração laboral.

Em 2010, o PCP lançou uma campanha, “Portugal a Produzir”, que afirmava o valor estratégico da produção nacional e o aproveitamento das potencialidades do país, para a criação de emprego, o combate à dependência externa e a afirmação de uma via soberana de desenvolvimento. No final dessa campanha, em 2011, foi publicado um livro com análises e contribuições ainda muito actuais. Essa publicação pode ser descarregada aqui.

Lê-se nesse volume:

As MPME têm um papel fundamental na economia nacional, pois são as principais responsáveis pela criação do emprego e da riqueza. Se considerarmos, daqui para a frente, as sociedades não financeiras, excluindo a agricultura, caça e silvicultura, existiam em Portugal, em 2008, cerca de 350 mil MPME, 99,7% de todas as sociedades, que representavam 72,5% do emprego, 59,8% do valor acrescentado bruto (ao custo de factores, V ABcf) e 60,9% do investimento (FBCF) do total das sociedades (não financeiras). (26)

São as MPME que sofrem, simultaneamente, o embate da concorrência internacional nos mercados interno e externo, os preços de monopólio de vários factores de produção estratégicos, o aperto dos grandes grupos de distribuição nacionais e a insuficiência e discriminação dos apoios públicos nacionais e comunitários, particularmente no que concerne às micro e pequenas empresas.

[...]

Contudo, tem emergido nos últimos anos um número cada vez maior de empresas, seja em áreas tradicionais, seja em áreas mais modernas, que apresentam elevados padrões de inovação, investigação, produtividade e competitividade, mesmo em mercados internacionais de elevada concorrência. Trata-se ainda de ilhas, embora nalguns sectores já com relevância, cujos efeitos de demonstração e de réplica relativamente a muitas das outras empresas deve ser acompanhado e acarinhado a escalas cada vez mais maiores.

É necessário que o Estado intervenha para auxiliar as MPME a superar as suas dificuldades intrínsecas, nomeadamente apoiando a sua modernização tecnológica e organizacional, para pôr fim aos abusos da sua dependência económica, nomeadamente garantindo-lhes o acesso ao mercado público e beneficiando-as no crédito e investimento públicos, mas sobretudo para contrariar o sufoco e a predação de que são alvo dos grandes monopólios, nacionais e estrangeiros. A nacionalização do sector energético e financeiro, acompanhada de uma política de discriminação positiva das MPME, contribuindo para lhes diminuir os custos dos factores de produção, constituiria para estas empresas um enorme balão de oxigénio. De modo geral, cada passo dado na luta contra o poder dos monopólios e no reforço de um reconstituído e renovado sector empresarial do Estado é um passo dado na protecção e auxílio às MPME. (74)

Um Convite à Ideologia Fascista

18.07.2018

Adenda sobre o debate no Prós e Contras de ontem. A Constituição da República Portuguesa aprovada na sequência do 25 de Abril de 1974 proíbe associações que perfilhem a ideologia fascista (artigo 46.º). O fascismo alimenta ódios socialmente destrutivos quando defende a absoluta supremacia de um grupo nacional, sócio-económico, religioso, étnico, ou racial sobre outro. Não é apenas antidemocrático no autoritarismo que lhe é essencial (habitualmente formalizado na obediência a um líder todo-poderoso), faz recuar a democracia em vez de a fazer avançar. Corrói-a por dentro. A Nova Portugalidade que defende a “(re)conquista” e a “civilização portuguesa” é uma organização fascista, braço da extrema-direita para ganhar espaço no espaço público, nomeadamente nas universidades. Tendo em conta o nosso enquadramento constitucional, como pode um membro desta organização ser convidado para participar num debate na televisão pública? Mais: independentemente do impedimento legal, como puderam os meus colegas da Universidade Nova de Lisboa (João Paulo Oliveira e Costa) e da Universidade de Coimbra (Carlos Fiolhais) manter-se daquele lado e ao lado de quem estavam quase sem demarcação no discurso? E, já agora, como puderam defender pontos de vista com os quais o convidado fascista concordou com acenos de cabeça, sem lerem imediatamente de forma ideológica esta concordância? Questões inquietantes. Estamos alerta.

Um Discurso do Passado Ditatorial

18.07.2018

Entre outras coisas, disse-se ontem no Prós e Contras que Cabo Verde é “um país forjado com escravos” (com imagens seleccionadas a dedo e tudo). Não se disse que Cabo Verde é um país que nasceu de um processo de independência. Uma leitura histórica que apaga a luta libertadora dos povos oprimidos pelo colonialismo português (e o PAIGC e Amílcar Cabral, neste caso) é um discurso do passado ditatorial, não do presente democrático. É urgente descolonizarmos a história e os museus.

Política Leviana

08.07.2018

O Orçamento do Estado para 2019 ainda não existe, mas Assunção Cristas já veio dizer que o CDS vai votar contra. Ainda no mês passado um deputado centrista falava na Assembleia da República sobre a necessidade de “proteger a seriedade na política”. Vai daí o seu partido decide promover a leviandade na política.